segunda-feira, 11 de abril de 2016

Procurava fora o que deveria estar dentro

Foto: Elena Mitsura (https://www.flickr.com/photos/exage)



Naquele fim de tarde, ao chegar em casa, cansada de carregar todo o peso de seus fantasmas, fechou a porta com os pés, tirou os sapatos e jogou-se no sofá. Os quilos perdidos não eram apenas falta de fome, eram resultado da exaustão de arrastar tanta carga todos os dias. Chegava sempre acabada, no limite de sua energia.

Os livros estavam espalhados pela mesa da sala, o controle da TV ao seu lado, precisava preparar a comida para o dia seguinte e colocar a roupa para lavar. Mas nada, simplesmente nada a fazia ter vontade de levantar dali. Ficava presa aos seus pensamentos, devaneios e desejos secretos. Tanta coisa para resolver, mas sua cabeça continuava alimentando aquele turbilhão de dúvidas e angústias. Estava sem forças para a vida. Faltava-lhe o essencial.

Cozinhava, sorria, escrevia, fotografava, conversava e até discutia com amor. Custava-lhe, entretanto, viver o desamor. Para ela, se amar era mudar a alma de casa, a falta de amor era desabrigá-la, desalojá-la e abandoná-la ao relento. Viver atrás desse amor, como quem procura um cantinho para se esquentar, para acolher o coração, vinha sendo a missão mais dolorosa de sua vida.

Ela revolvia as lembranças, as fotos, os papéis, o passado, tentando entender o porquê de estar sempre correndo atrás de algo que não lhe pertence. São anos nesse papel, talvez tenha começado antes mesmo de nascer. Verdade é que buscava esse amor em todos os cantos da sua alma, em todas as suas relações e até na função que achava que deveria desempenhar no mundo.

Seus fantasmas a atormentavam insistentemente. Provocavam, cutucavam a ferida mal curada, novamente exposta, ardendo. Ela não encontrava mais o remédio no mundo. O coração pulsava a duras penas tentando manter alguma vida ali dentro.


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