Ironia, a casa está vazia. Todo aquele espaço parece grande demais para me caber dentro. O sofá incomoda, não consigo me encaixar sozinha. A cama está imensa e ainda guarda o cheiro doce dos últimos dias. A louça está na pia. A toalha e a escova não saíram do lugar. A temporada ficou inacabada.
A memória continua viva. Talvez pela iminência do fim, ou pela sinceridade dos sentimentos abertos, mas as últimas horas parecem inesquecíveis. Ironia novamente. Tudo se encaixou perfeitamente bem quando nada mais poderia existir.
O livro continua na cabeceira, ele ajuda a manter o cenário construído com a sua presença. A cada página passada tento imaginar onde você está. Você entenderia se te mandasse uma referência? Você aceitaria se te mandasse uma referência? E eu tenho algum direito a isso?
No capítulo seguinte, um papel cai. Aquele que você se dedicou tanto para escrever. Aquele que me emocionou. Aquele que me assustou. O mesmo, que agora, me aquece. Leio uma, duas, três vezes tentando perceber o que não captei na leitura anterior. Cada palavra me deixa mais ofegante, quero desmanchar.
Mas minha respiração ecoa em todo esse vazio. Não sei mais dizer se ele é interno ou externo. Me sinto culpada, arrependida. Me sinto incapaz de corresponder a tamanha dedicação. Deve ser o tal do marxismo. A autoaversão que me impede de aceitar tanta entrega. Como é possível? "eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil"... A verdade é que amar é pra todos. Ser amada é pra poucos.
Escrito em 9 de julho de 2016.
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